Janeiro Branco: saúde mental em foco o ano todo

Janeiro Branco: saúde mental em foco o ano todo

Nos últimos anos, o Janeiro Branco entrou de vez no calendário de campanhas de saúde no Brasil. A proposta é simples e, ao mesmo tempo, profunda: usar o primeiro mês do ano como convite para falar, sem tabu, sobre saúde mental e emocional, tanto na vida pessoal quanto nos serviços de saúde. 

A campanha nasceu em 2014, idealizada pelo psicólogo mineiro Leonardo Abrahão, inspirada em movimentos como Outubro Rosa e Novembro Azul, com foco em sensibilizar a população, estimular o cuidado preventivo e fortalecer políticas públicas na área. 

O objetivo deste artigo é conectar o Janeiro Branco ao dia a dia de quem vive a saúde “por dentro”: profissionais, estudantes, serviços, clínicas e pacientes. 

O que significa falar em saúde mental? 

De acordo com o Ministério da Saúde, com base na definição da Organização Mundial da Saúde (OMS)saúde mental é um estado de bem-estar em que a pessoa consegue usar suas habilidades, lidar com os estresses normais da vida, trabalhar de forma produtiva e contribuir com sua comunidade. 

Ou seja, não se trata apenas de “não ter um transtorno mental”, mas de um conjunto de fatores

  • emocionais (como luto, tristeza, medo, raiva, alegria), 
  • físicos (sono, alimentação, dor, doenças crônicas), 
  • sociais (trabalho, renda, moradia, vínculos, segurança), 
  • culturais e ambientais. 

OPAS/OMS reforça que saúde mental é um direito humano fundamental, parte inseparável da saúde como um todo. 

Janeiro Branco: por que janeiro e por que branco? 

A campanha escolheu janeiro por ser o mês em que muitas pessoas fazem balanços, revisam metas, reorganizam a rotina e projetam o ano. A cor branca simboliza um “quadro em branco”: a ideia de que cada pessoa, família, serviço ou equipe pode repensar relações, hábitos e projetos de vida

Instituições públicas, universidades e fundações como Fiocruz Fiotec vêm utilizando o Janeiro Branco para: 

  • estimular conversas abertas sobre sofrimento psíquico, 
  • combater o estigma associado a transtornos mentais, 
  • promover ações de educação em saúde e acolhimento, 
  • reforçar a importância de redes como CAPS, atenção primária e apoio psicossocial. 

Na prática, o Janeiro Branco funciona como um marcador simbólico: um lembrete de que saúde mental deveria ser tema de janeiro a janeiro, não apenas em um mês específico. 

O cenário da saúde mental no Brasil e no mundo 

Relatórios recentes mostram que os desafios em saúde mental são grandes, e crescentes. 

OMS estima que mais de 1 bilhão de pessoas no mundo vivem com algum transtorno de saúde mental, sendo ansiedade e depressão os mais frequentes. Esses transtornos estão entre as principais causas de incapacidade, com impacto direto na qualidade de vida e na produtividade. 

Durante a pandemia de Covid-19, a OPAS/OMS apontou aumento de cerca de 25% na prevalência global de ansiedade e depressão no primeiro ano da crise sanitária, com maior impacto em mulheres, jovens e pessoas já em situação de vulnerabilidade. 

No Brasil, dados compilados pelo Ministério da Saúde e por instituições especializadas indicam: 

  • elevada prevalência de transtornos de ansiedade e depressão; 
  • impacto desproporcional em grupos mais vulneráveis; 
  • pressão importante sobre a rede de atenção psicossocial (CAPS, atenção básica, ambulatórios). 

Tudo isso reforça o que o Janeiro Branco se propõe a lembrar: saúde mental é tema de saúde pública, não apenas uma questão individual. 

Sinais de alerta: quando acender a luz amarela 

É comum que, na prática clínica, pacientes e familiares perguntem “onde termina o cansaço normal e começa um problema de saúde mental?”. Não existe resposta simples, e a avaliação deve sempre ser feita por profissional habilitado, mas algumas pistas ajudam a orientar o olhar: 

  • tristeza persistente por semanas, com perda de interesse em atividades que antes faziam sentido; 
  • irritabilidade, ansiedade intensa ou “preocupação que não desliga”; 
  • alterações importantes de sono (insônia ou sono em excesso) e apetite; 
  • dificuldade para se concentrar, tomar decisões simples ou desempenhar tarefas habituais; 
  • queixas físicas recorrentes sem causa orgânica clara (dores, fadiga, palpitações); 
  • uso abusivo de álcool ou outras substâncias como forma de “aliviar” o sofrimento; 
  • falas frequentes de desesperança, inutilidade ou desejo de “sumir”. 

Em qualquer situação de risco de autoagressão ou ideia de morte, é fundamental acionar serviços de urgência/emergência, buscar apoio em CAPS/UPA/UBS e em redes como o Centro de Valorização da Vida (CVV – telefone 188, chat e e-mail), que oferece escuta 24h e gratuita. 

E quem cuida? Saúde mental de profissionais e estudantes 

Campanhas como o Janeiro Branco também chamam atenção para a saúde mental de quem está na linha de frente: médicos, enfermeiros, equipes de enfermagem, fisioterapeutas, psicólogos, farmacêuticos, profissionais de apoio, residentes, internos e estudantes de diferentes áreas. 

Entre os fatores de risco para sofrimento psíquico nessas categorias, estudos destacam: 

  • jornadas extensas, plantões sucessivos e falta de descanso; 
  • contato frequente com sofrimento, morte e situações críticas; 
  • sobrecarga emocional em ambientes de alta demanda e baixa estrutura; 
  • medo de erro, processos e responsabilização; 
  • dificuldade em pedir ajuda por medo de estigma ou de “fragilidade”. 

Iniciativas de Janeiro Branco em instituições de saúde (como as citadas por Fiocruz e experiências registradas no IdeiaSUS) mostram estratégias como rodas de conversa, grupos de apoio, ações educativas sobre estresse, ansiedade e burnout, e campanhas internas focadas em acolher quem cuida. 

Promoção de saúde mental: o que ajuda na rotina 

Saúde mental não se resume a “tratamento quando algo vai mal”. A literatura em saúde pública e políticas de promoção fala em cuidado contínuo, com pequenas decisões diárias que se somam. 

Algos pontos-chave: 

1. Rotina minimamente previsível 

Ter horários mais ou menos estáveis para acordar, se alimentar e dormir ajuda a regular o ritmo circadiano, com impacto direto em humor, energia e capacidade de concentração. 

2. Movimento corporal 

A OMS e diferentes revisões científicas mostram que atividade física regular está associada à redução de sintomas de depressão e ansiedade, melhora do sono e da qualidade de vida, em diferentes faixas etárias.  

Isso não significa, necessariamente, treinos intensos; caminhadas, alongamentos, danças, exercícios respiratórios e práticas de corpo e mente, sempre dentro das possibilidades de cada pessoa, já fazem diferença. 

3. Vínculos e redes de apoio 

A sensação de pertencimento, família, amigos, grupos de estudo, equipes, comunidades religiosas ou culturais, atua como fator protetor importante. Campanhas como Janeiro Branco insistem na ideia de falar sobre o que se sente, acolher sem julgamento e construir espaços seguros de escuta. 

4. Monitorar a saúde física 

Muitas condições físicas (hipertensão, doenças cardiovasculares, dor crônica, problemas respiratórios, distúrbios do sono) se entrelaçam com sintomas de sofrimento psíquico. 

Na prática clínica, é comum que o cuidado integral envolva: 

  • monitorar sinais vitais (pressão, frequência cardíaca, saturação), 
  • acompanhar doenças crônicas, 
  • articular o cuidado com equipes de atenção primária. 

Nesse ponto, a infraestrutura de aparelhos médicos  como esfigmomanômetros, oxímetros, estetoscópios e termômetros, ajuda a manter a vigilância clínica em consultórios, serviços e no home care, integrando saúde física e mental.  

5. Reconhecer o momento de buscar ajuda especializada 

Psicólogos, psiquiatras, equipes multiprofissionais em CAPS e serviços de saúde mental são fundamentais quando o sofrimento se torna persistente, intenso, incapacitante ou associado a risco. Campanhas oficiais reforçam que pedir ajuda é ato de cuidado, não de fraqueza

Janeiro Branco em serviços de saúde: o que as equipes podem fazer 

Para clínicas, consultórios, hospitais, laboratórios, serviços de reabilitação e unidades básicas, o Janeiro Branco pode ser um gatilho para iniciativas práticas, como: 

  • inserir conteúdos sobre saúde mental em redes sociais, blogs e materiais educativos da instituição; 
  • promover encontros internos sobre manejo de estresse, comunicação não violenta, empatia e prevenção de burnout; 
  • revisar fluxos de encaminhamento para CAPS, ambulatórios de referência e serviços de urgência em saúde mental; 
  • organizar campanhas integradas com outras datas (como Setembro Amarelo – prevenção do suicídio, já abordado no blog da UC).  

A experiência do IdeiaSUS/Fiocruz mostra exemplos de ações em atenção básica articuladas ao Janeiro Branco, como rodas de conversa sobre bem-estar emocional, espaços de escuta e educação em saúde mental em unidades de saúde da família. 

Conclusão 

O Janeiro Branco não é apenas um slogan de começo de ano. É um convite a: 

  • reconhecer que saúde mental é parte integrante da saúde
  • olhar com mais cuidado para o próprio bem-estar emocional e o das pessoas ao redor; 
  • fortalecer redes, políticas públicas e estruturas que viabilizam cuidado adequado; 
  • lembrar que profissionais de saúde também precisam ser cuidados. 

Para quem vive a rotina clínica de perto: médicos, enfermeiros, estudantes, equipes de gestão, pacientes, falar de saúde mental é falar de clima de equipe, acesso, carga de trabalho, vínculos, estrutura de serviços e acesso a informações confiáveis. 

A cada janeiro, a campanha ajuda a acender a luz. A ideia é que, nos meses seguintes, esse cuidado se torne parte da rotina nas escolhas, nos protocolos, nas conversas e nas formas de organização dos serviços. 

Fontes 

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